sábado, 3 de junho de 2017

O Ciclo das Sombras - Cap. 1/pt. 6

Olá Queridos Leitores,

Após muito tempo,cá estou eu publicando mais uma parte do primeiro capítulo. Espero que gostem.

Cap. 1/ pt. 6

Permanecia quieta durante o trajeto de volta para casa quando uma ideia lhe surgiu de repente:
            “E se eu descesse na parada da casa e fosse dar uma voltinha só pra ver como é?”
            Parecia algo sem pé nem cabeça, mas não custava nada tentar. O máximo que iria acontecer era não passar do portão de ferro e ter de voltar para casa no próximo ônibus.
            “Vamos lá então...” — disse enquanto se levantava e acionava o sinal para descer. — “O que parece eu com esta cesta de piquenique descendo aqui nesta parada. Parece a Chapeuzinho Vermelho indo visitar o Lobo... — pensou rindo do pensamento que teve.
            Desceu na parada vazia. Olhou ao redor e não viu ninguém. Por um momento ficou indecisa, mas decidiu seguir em frente, não tinha descido do ônibus só para ter que esperar o próximo ônibus. Seria idiotice.
A cada passo que avançava, Kimberly sentia o coração acelerar. Era uma sensação muito estranha, como se ela fosse encontrar alguma coisa na casa abandonada.
Caminhou até chegar às grades de ferro. Com a mão livre, segurou a grade enferrujada como se estivesse buscando apoio para não perder o equilíbrio. Permaneceu assim por algum tempo tentando entender o porquê estava ali parada.
“Doida, doida, doida...” — pensou consigo mesma. — “O que eu estou fazendo aqui, nervosa desse jeito? É só uma casa aband...” — parou o pensamento, pois sentiu que havia algo errado ali.
Havia alguém atrás da janela do terceiro andar... a sensação de estar sendo observada ficou muito forte e Kimberly desviou o olhar da casa e olhou para a sua mão agarrada à grade de ferro.
“Preciso sair daqui...” — pensou, mas sua mão não aliviou nem um pouco o aperto na grade. Parecia ter colado a mão ali para sempre.
Tornou a olhar para a janela. Olhando mais atentamente percebeu que não havia nada além do vento brincando com as cortinas.
— Imaginação absurda — disse para si mesma.
Aos poucos, conseguiu abrir a mão e soltar a grade, mas a sensação de que estava sendo observada ainda era muito forte.
Kimberly continuou parada em frente ao portão por mais alguns minutos. Não sabia se entrava ou se ia embora. Olhou mais uma vez para a casa e depois lançou o olhar para o terreno a frente. O capim crescera e se espalhara pelo que fora antes um jardim. O caminho que levava até a entrada da casa havia desaparecido há tempos.
— Vou deixar para bancar o Indiana Jones outra hora — falou para si mesma — pode ter um bicho por aí e eu não quero me assustar mais do que já estou.
Suspirou e deu meia volta. No terceiro passo ouviu algo que fez seu sangue gelar nas veias. Parecia uma respiração. Uma respiração lenta e pesada bem atrás dela, por cima do ombro direito. A certeza de que, agora, tinha alguém ali, deixou-a paralisada de pavor. Não havia muito a fazer, ou ela se virava e verificava o que era ou então permaneceria ali por um bom tempo, até que pudesse se controlar mais.
Uma brisa suave passou por ela fazendo-a sentir um leve perfume doce amadeirado. Kimberly inspirou profundamente o perfume e pensou:
“Deus, que cheiro bom! Deve custar uma fortuna um perfume destes.”
Mal terminou de pensar isto e se assustou de novo. Se não havia ninguém por perto, como poderia haver um perfume como se realmente houvesse alguém ali, com ela?
“Chega, é agora ou nunca” — pensou virando-se bruscamente.
Não encontrou nada nem ninguém, só o portão fechado, o jardim malcuidado e o silêncio da casa.
“Eu disse que não tinha nada”— pensou suspirando aliviada. — “Estou ficando doida. Está na hora de voltar para a casa.”


Kimberly não almoçou quando chegou a casa. Estava cansada como se tivesse corrido quilômetros sem parar. Ela não imaginara que a visita a casa resultasse em um pré-ensaio de ataque cardíaco. Nunca ficara tão assustada e seu coração nunca batera tão rápido como batera quando ela podia jurar que realmente havia alguém atrás dela.
— Eu disse que tinha algo estranho na casa — falou para si mesma.
De repente, Kimberly não sabia o que fazer. Era sábado e ela não tinha plano algum. Não tinha amigos para sair, não tinha parentes para visitar, não tinha familiares para conversar... não tinha ninguém além do tio que visitava quinzenalmente. Atirou-se no sofá da sala e falou em voz alta:
—Talvez eu devesse comprar um bicho de estimação e me entreter um pouco... sair para passear com ele... levar ao veterinário... limpar a sujeira que fizer no apartamento... — parou por um momento e decidiu. — Não. Decididamente, um bicho de estimação está fora de cogitação.
Tentou se imaginar brincando com um cachorrinho. Chegou a rir da situação, mas mesmo que tivesse condições de sustentar o bichinho, não tinha paciência para cuidar dele. Seria um caos chegar todas as noites e ter de limpar a sujeira que ele faria enquanto ela estivesse fora ou ter de sair para passear mesmo em dias chuvosos e frios, porque o bichinho iria querer sair para fazer as suas necessidades. Não, realmente não era uma boa ideia.
Recostou a cabeça no sofá e fechou os olhos. A primeira imagem que lhe surgiu foi a casa: quieta, silenciosa e abandonada... Tinha que haver alguma coisa estranha com aquela casa... não era normal... Será que havia mendigos morando nela? Se houvesse, como explicar aquela sensação terrivelmente forte de que alguém estivera ali com ela? Mendigos não eram sorrateiros e, sem dúvida nenhuma, não cheiravam a perfume importado.
— Deus do céu... chega disso — falou como se estivesse conversando com alguém. — Eu estou loquiando. Isto não é normal... essa obsessão por essa casa...
Abriu os olhos e se inclinou para frente para apoiar a cabeça nas mãos. Aquilo tinha que parar, estava ficando doentio.
— Vou acabar fazendo companhia para o meu tio assim...
Balançou a cabeça como se quisesse eliminar tal pensamento. Mas o que poderia fazer? Há seis meses ela não tinha vida social. Só ia de casa para o trabalho e do trabalho para casa. Não falava com mais ninguém a não ser seu tio e os colegas de trabalho, quando estava na empresa. Precisava iniciar algo diferente, não podia desperdiçar sua juventude e sua vida desse jeito. Sua família tinha morrido, mas ainda havia Douglas, e ela deveria ser forte pelos dois, principalmente quando seu tio recobrasse a razão e percebesse a verdade dos fatos. Kimberly precisava estar lá para ampará-lo.
Mas ainda assim, era esquisito. Era esquisito que uma casa pudesse chamar tanto sua atenção. Kimberly era muito racional para a maioria das coisas que lhe aconteciam, mas sabia que havia alguma coisa além do racional naquela moradia. O que acontecera pela parte da manhã não era normal. A sensação de que tinha alguém ali, observando-a, era muito palpável e ela ia sim investigar o que é que estava acontecendo. Não importava o tempo que levasse e isso era o que ela mais tinha no momento: tempo.
Sem ter o que fazer durante o resto do sábado, Kimberly arrumou a casa pela terceira vez na semana. Quando o relógio marcou vinte e duas horas, tudo já estava organizado. Não restava mais nada a não ser tomar banho e ir dormir.
Depois que deitou, Kimberly demorou a pegar no sono. Muitas imagens passavam em sua mente. A lembrança de Martin passeando com ela no shopping, a visita que fizera ao tio, a expedição doida a casa, a sensação de... Com esse pensamento, Kimberly finalmente dormiu. E sonhou.


Estava novamente parada em frente a casa. O dia estava terminando e o sol se pondo. O silêncio era esmagador e não havia ninguém pelas redondezas. Então, ela soltou a grade de ferro, virou-se e caminhou para longe, mas não pôde seguir adiante porque a mesma respiração que sentira de manhã estava ali, de novo, sobre o seu ombro direito.
Anoitecia rapidamente e a escuridão tomava conta de tudo. O medo de antes triplicara e Kimberly sentia o coração doer de tanto bater forte.
            “Não posso me virar” — pensou no sonho. — “Não estou mais corajosa como antes... vou morrer de medo.”
A presença era muito forte. Kimberly tinha certeza de que não estava sozinha.
Paralisada de pavor, Kimberly começou a ficar tonta e se deu conta de que iria desmaiar se não voltasse a respirar. Aspirou o ar com dificuldade e, quando pensou ter normalizado a respiração, sentiu o perfume doce amadeirado muito forte. Tonteou, perdeu o equilíbrio e, se não fosse pelas grades de ferro, teria caído de costas.
Suspirou aliviada e, por um momento, fechou os olhos. Mas havia algo errado ali, ela não estava apoiada no portão de ferro. De regra, portões de ferro não têm contornos humanos. Ela havia encostado-se a alguém. Alguém alto, forte e maciço como um portão de ferro. O terror que tinha se dissipado voltou com intensidade e, quando Kimberly ia juntar forças para se afastar, sentiu dois braços em torno de sua cintura e duas mãos pálidas entrelaçaram-se a sua frente, impedindo-a de se mover.
A respiração ficou mais forte em seu ouvido. Kimberly ia preparar-se para gritar quando de repente não estava mais de costas para quem quer que fosse e sim de frente. Ela girou tão rápido que fechou os olhos com força temendo ver um monstro. Os braços em torno dela estreitaram-se mais e o perfume doce invadiu seu nariz, deixando-a tonta. Lentamente, abriu os olhos e o que viu a fez perder o fôlego.
Diante dela havia um homem. Pálido e muito bonito, parecido com aqueles modelos de passarela. Seus traços eram finos e firmes ao mesmo tempo e o seu olhar fez com que Kimberly, por um momento, esquecesse quem era e onde estava. Eram verdes, mas não um verde comum. Eram verdes quase azuis e eram tão brilhantes... Kimberly sustentou o olhar e abriu a boca para dizer alguma coisa, mas o som não saiu e ela começou a ofegar.
Ele a apertou mais contra os braços fortes e falou com uma voz grave e em alemão:
Gute Abend meine Liebe. (Boa noite minha querida).
Kimberly sentiu um arrepio percorrer seu corpo como uma corrente elétrica. Ele era tão lindo, não parecia real e aqueles olhos... eram hipnóticos.
“O que foi que ele disse mesmo?” — Pensou tentando organizar os pensamentos.
Mas não conseguiu. Ele sorriu para ela de um jeito enigmático, fazendo-a desfalecer em seus braços e, quando ele ia se aproximar mais dela, provavelmente para beijá-la, Kimberly viu algo que a fez arregalar os olhos. Atrás dele, abriram-se duas asas enormes de morcego e, na mesma hora, ela soube que eram dele. Gritou com todas as forças:
— Não! ─ Gritou assustada enquanto acordava e sentava-se na cama.

Até a próxima!


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