Segue o capítulo 4 do Ciclo para vocês :)
CAPÍTULO 4
O começo do ciclo
Quando
abriu os olhos, Kimberly viu um teto impecavelmente branco. Virou a cabeça para
a direita e viu uma janela fechada, também impecavelmente branca. Olhou para a
esquerda e constatou que havia uma cadeira, um sofá e uma cômoda, também
brancos. O aposento em que ela se encontrava era todo branco. À frente da cama,
onde estava deitada, havia uma cortina de algodão branco que, provavelmente,
tinha a função de dar-lhe privacidade, separando-a do resto do quarto.
“Um
hospital?” — Questionou tentando recordar-se do que havia acontecido.
Não
conseguia lembrar-se de muita coisa, mas tinha uma vaga lembrança do que
acontecera. Devagar, levou a mão ao rosto e tocou o lado direito. Mal o tocou,
sentiu dor e pôde perceber que o rosto estava muito inchado.
—
Isto deve estar horrível — disse baixinho para si mesma.
Tentou
se levantar, mas a tontura veio muito forte e ela deitou novamente. Queria sair
da cama e achar um espelho para olhar o “estrago” que o assaltante fizera. Se
estivesse muito feio, na certa, ela teria de ficar em casa. Não poderia ir
trabalhar com o rosto inchado daquele jeito, ainda mais tendo que atender aos
clientes da empresa.
“Preciso
pensar em uma desculpa plausível para dar ao pessoal, Vilton vai me matar” —
concluiu fechando os olhos.
O
silêncio que pairava no quarto era um pouco opressor e deixava Kimberly
preocupada. Passava a impressão de que ela havia sido abandonada naquele lugar
e estava sozinha, entregue a própria sorte. Como ela fora parar naquele lugar?
Ela não havia embarcado em um táxi e chegado em casa? De repente, a imagem
nítida de Ulrich lhe veio à mente. Com certeza, fora ele quem a trouxera ali.
Ela suspirou aliviada ao concluir isso, mas em seguida, estava amedrontada de
novo: fora ele, também, quem atacara os assaltantes e quem fizera aquele
estranho som de animal selvagem.
Começou
a ficar assustada de novo e com muita vontade de ir embora dali o mais rápido
possível. Abriu os olhos e esforçou-se para sentar na cama. Ia sair, mesmo sentindo-se
tonta, quando percebeu que estava usando uma camisola branca. Olhou pelo quarto
à procura de suas roupas, mas não as encontrou.
“Maravilha,”
— pensou suspirando — “vou ter de sair de camisola então.” — Recostou-se nos
travesseiros, pensou e conclui desanimada. — “Como é que eu vou embora daqui se
nem a minha bolsa eu vejo? Presa, estou presa aqui. Onde será que est...” —
interrompeu o pensamento quando ouviu passos do outro lado da cortina. Alguém
havia entrado no quarto. A brisa leve que balançara a cortina, provava isso.
Imediatamente,
Kimberly ficou quieta procurando não fazer nenhum movimento para que quem quer
que fosse que havia chegado, continuasse pensando que ela ainda estava
dormindo. Ela pôde perceber que, no mínimo, duas pessoas haviam entrado no
quarto.
Começaram
a falar tão baixo e tão rápido que ela mal conseguia entender.
— Ich sagte Ulrich, das wäre gefährlich! (Eu lhe disse Ulrich, que isso era perigoso!)
— Ich weiβ... ich weiβ, aber was hätte ich tun können? (Eu sei, eu sei,
mas o que eu devia fazer?)
Kimberly não
entendia nada do que eles estavam falando e desejou que eles falassem em
português, para saber qual era o assunto que eles conversavam com tanto fervor.
Como se um deles tivesse captado os pensamentos dela, começou a falar em
português.
—
Você deveria ter deixado ela lá: com os assaltantes!
—
E deixar que eles a matassem? — Perguntou Ulrich.
—
Que fosse! — Falou a voz baixa e indignada do outro homem. — Que fosse! Você
não podia tê-la trazido para cá! — Falava preocupado.
Kimberly
encolheu-se mais na cama, pois havia ficado com medo. Pelo rumo que a conversa
estava tomando, ela chegava à conclusão que corria mais perigo no hospital do
que com os homens que a machucaram. Em que lugar ela fora parar? Aquilo não era
um hospital então?
—
Wagner, — começou Ulrich, falando mais calmo — trazê-la para cá foi a única
opção que tive. Aqui é o lugar mais seguro do que qualquer outro. Ninguém aqui
vai ousar me enfrentar, você sabe disso!
Houve
um breve silêncio, provavelmente o outro estava ponderando o que Ulrich lhe
dissera.
—
Ich weiβ (eu sei), — disse Wagner
mais calmo — mas você bem sabe que ela não é do grupo! Ainda assim, é perigoso
trazê-la para cá. Os outros sentem à quilômetros de distância que ela é de
fora!
Mais
uma pausa e Wagner continuou:
—
Eu sei que ninguém vai ousar enfrentar você, mas você também sabe muito bem das
regras que seguimos por aqui. Der Kongreβ der Ältesten (O Congresso dos Anciãos) não vai gostar
nada disso, Ulrich!
—
Wagner! — Sibilou Ulrich com uma voz estranha. — Sie ist kein Opfer!(Ela não é um alvo!) Ela percebeu o nível de
energia! Ela captou a diferença, foi por isso que ela veio até a minha casa! E
ela me chamou quando estava em perigo!
Pelo
tempo que Wagner levou para responder, Kimberly deduziu que ele estava
analisando os argumentos de Ulrich.
— Ist das wahr
(isto é verdade?) — Indagou surpreso.
— Ja, es ist wahr ( sim,
é verdade). Ela tem uma atração muito forte! Eu a observava todos os dias,
quando ela passava em frente à minha casa. Ela sempre soube que havia alguma
coisa diferente — fez-se uma breve pausa e Ulrich disse, alterando um pouco o
tom de voz. — E ela sonhou — disse como se isso fosse a coisa mais importante
no mundo.
—
Der Traum (O sonho?) — Questionou
Wagner espantado.
—
Ja (sim!). — Ulrich tornou a falar baixo. — Ela sonhou comigo! Duas
vezes! Foi em minha casa... nós conversamos e, quando ela entrou na casa pela
primeira vez, conhecia cada lugar e sabia exatamente aonde ir! Quando nós nos
vimos, de fato, ela estava assustada, porque não conseguia entender como aquilo
era possível! Entende agora o porquê eu a trouxe para cá?
O
silêncio respondeu por Wagner.
Kimberly
ouvia a conversa impressionada. Era informação demais e ela não conseguia
entender o que significavam todas aquelas palavras. Estava tão absorta em
tentar encontrar um significado para aquilo tudo, quando de repente se assustou
ao ver os dois homens ali, parados ao lado de sua cama.
“Como
entraram aqui sem eu perceber?” — Perguntou para si mesma, tentando acalmar-se.
—
Gute Abend, meine Liebe (boa noite, minha
querida) — cumprimentou Ulrich. — Espero que você esteja melhor — ele disse
de forma encantadora.
Kimberly
não conseguiu pronunciar uma palavra. Estava pasma. Agora, com o quarto e a luz
brancos, ela realmente podia observar Ulrich melhor. Ele era tão branco quanto
a parede e o resto do quarto, se fosse um camaleão na certa se confundiria com
ela. Os olhos verdes azulados se destacavam com aquele brilho hipnótico e o
cabelo preto ondulado, que lhe caía até os ombros, fazia-o parecer um ser de
outro mundo. Com muito esforço, ela conseguiu desviar os olhos de Ulrich para
observar Wagner. Ele era tão branco quanto Ulrich, tinha belíssimos olhos azuis
e cabelos castanhos curtos. E, assim como o amigo, se era assim que ela podia
classificá-lo, ele tinha um perfume muito bom, assemelhado àqueles perfumes
importados cítricos. Logo que Kimberly inspirou o perfume de Wagner, sentiu-se
tonta e teve de fechar os olhos para evitar perder o equilíbrio.
— Sie sehen, was ich meine? (Você vê o que eu quero dizer?) — Indagou Ulrich sorrindo para Wagner. — Ela percebeu! Só
que não sabe! Ich sagte: sie ist
kein Opfer(Eu disse: ela não é um alvo!).
— Unglaublich!
(Incrível!) — disse Wagner espantado.
—
Eu lhe disse Wagner, eu lhe disse — falou Ulrich sorrindo.
Kimberly
olhava de um para outro sem entender absolutamente nada, não bastasse o fato de
eles conversarem a todo o momento em alemão, eles ainda falavam coisas que,
para ela, não tinham sentido algum. Embora não houvesse lógica nenhuma na
conversa doida deles, Kimberly sabia que era sobre ela que conversavam.
Ela
continuava a olhar para os dois com os olhos arregalados, sem saber o que fazer
e se encolheu instintivamente, quando o médico aproximou-se de Kimberly e disse
enquanto segurava cuidadosamente o pulso dela para verificar os batimentos
cardíacos:
—
Boa noite, — cumprimentou com o carregado sotaque alemão, percebendo que ela se
encolheu quando ele a tocou, pois Wagner era tão gelado quanto Ulrich. — Sou o
doutor Wagner Stein. Não se preocupe, estou aqui para cuidar de você.
Aquela
última frase soou estranha aos ouvidos dela, “cuidar de você” não parecia ter
sido empregado com o significado que deveria ter.
—
Obrigada — respondeu num fio de voz.
—
O seu rosto está inchado e, infelizmente, não há muito que fazer. O tempo vai
se encarregar disso. Eu receitei uma pomada muito boa que vai ajudar a diminuir
o hematoma. Agora, o motivo de você ainda estar aqui se deve ao fato de ter
batido com a cabeça quando caiu. Você está em observação. Só vou dar alta,
quando você não estiver mais tonta, você entende?
Ela
quase respondeu: “Claro que eu entendo. Pela conversa doida de vocês, eu sou
uma cobaia aqui.” Mas não disse nada, apenas balançou a cabeça afirmando.
Wagner
verificou a pulsação, fez algumas anotações no prontuário, dirigiu um sorriso
estranho para Kimberly, despediu-se dela e disse em alemão para Ulrich antes de
sair.
—
Das ist zu viel für meinen Kopf... (isto
é demais para a minha cabeça...) — e saiu do quarto, deixando os dois a
sós.
O
silêncio tomou conta do quarto, Kimberly não sabia o que fazer. Baixou a cabeça
e cruzou os braços como se estivesse se protegendo. Mordeu o lábio inferior e
pensou em dizer alguma coisa, mas o clima estava um pouco pesado. Ela sentia-se
uma estranha em um lugar esquisito e queria ir para seu apartamento. Não estava
muito preocupada nem com a pancada que levara na cabeça, nem com a
possibilidade de voltar a tontear, só queria ir embora para longe dali.
Continuou
com a cabeça baixa, fechou os olhos e respirou fundo. Antigamente, quando a sua
vida era normal, isso ajudava a ficar mais calma, mas ultimamente, respirar
fundo não surtia mais o efeito esperado. A única coisa que ela conseguiu com
isso, foi sentir mais uma vez o perfume doce dele, fazendo-a perder a noção das
coisas por alguns segundos.
Espero que estejam gostando da história.
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Até segunda que vem.