segunda-feira, 30 de março de 2015

O ciclo das sombras Cap. 1/ pt. 2

Olá Queridos Leitores!!

Como prometido aqui estou eu novamente para postar mais uma parte do livro.
Espero que estejam gostando.

Acordou às seis e meia, como de costume, arrumou-se e saiu para a parada do ônibus. Faltavam ainda alguns minutos para passar o próximo ônibus. Enquanto esperava, pensava:
“Mas que viagem... todas as casas tinham foto, por que justamente a que eu queria não tinha? Nem deveriam ter colocado o link da foto então...”
Quando se deu conta, o ônibus já estava na parada. Assustou-se pela falta de atenção. Estivera tão distraída pensando na casa que nem percebeu o ônibus chegar.
“Ainda bem que era um ônibus e não um assaltante” — concluiu enquanto embarcava no coletivo.


— Bom dia pessoal — cumprimentou quando entrou na sala.
— Bom dia, Kim — responderam Brian e Penélope juntos.
Kimberly sentou-se em sua mesa e começou a olhar as tarefas que tinha para fazer naquele dia.
— Ah, sim — disse Brian de repente. — Nós cinco vamos sair para beber alguma coisa depois do expediente, quer vir conosco Kim?
— Vão aonde? — Perguntou enquanto organizava alguns papéis.
— Naquele barzinho maneiro que tem perto do posto de gasolina — respondeu Penélope.
Kimberly parou o que estava fazendo e perguntou:
— Que posto? Onde é esse barzinho, estou completamente perdida...
— Sabe aquele posto que fica há umas cinco paradas aqui da empresa? Bem na avenida?
Alguns segundos depois, Kimberly sabia perfeitamente qual era o barzinho.
— Ah sim, o barzinho que fica no lado oposto da casa! — Exclamou involuntariamente.
— Que casa?
Depois que Brian fez a pergunta, Kimberly se deu conta de que tinha falado da casa em voz alta. Nenhum dos seus colegas sabia de seu interesse pela moradia.
— Casa? Nenhuma casa. Estou viajando... — fez uma pausa e disse para mudar de assunto. — Bem... e por que não? — Respondeu sorrindo. Assim, teria uma oportunidade de ver a casa mais de perto. — “E de fazer alguma coisa diferente para mudar a rotina...” — concluiu com um leve suspiro.


Quando o relógio marcou quatorze horas, a senhorita Dvenau chegou. Era uma loira afetada, metida à patricinha e muito arrogante. Kimberly a detestava, mas tinha que tratá-la bem, afinal, o pai dela era um dos melhores clientes que a Arts Designer tinha. Kimberly a recebeu na sala de reuniões da empresa.
— Boa tarde, senhorita Dvenau.  Sente-se — disse indicando uma cadeira.
— Boa tarde — respondeu com o nariz empinado. — Não quero ser grosseira com você, — começou em tom impertinente — mas meu pai nã...
— Eu sei o que vai dizer — interrompeu Kimberly secamente. — Seu pai não vai gostar do trabalho que estamos fazendo. Mas devo lembrá-la de que lhe mostramos a prova do convite umas três vezes e em todas às vezes a senhorita achou uma maravilha. Porém, após certo tempo, você nos ligou e disse que não foi a fonte que você escolheu que nós utilizamos.
A senhorita Dvenau ia abrir a boca para dizer alguma coisa, mas Kimberly a interrompeu.
— Não sei se a senhorita se deu conta, mas seu casamento está quase chegando e nossa equipe tem o prazo de entregar esses convites prontos e perfeitos até o final da semana que vem. E, como eu sei que a senhorita tem um gosto refinado, então é claro que vai querer qualidade 100% em seus convites, mas para isso, eu preciso que a senhorita se decida de uma vez por todas.
Mais uma vez a senhorita Dvenau iria falar alguma coisa, mas Kimberly se adiantou.
— Eu fiquei pensando durante o dia de ontem sobre o seu convite e achei ideal que ele fosse assim, que acha? — Perguntou enquanto levantava-se da cadeira e virava o notebook para a senhorita Dvenau poder acompanhar o que seria alterado. Em seguida, começou a fazer as mudanças no convite.
A senhorita Dvenau não abriu mais a boca, apenas ficou olhando Kimberly fazer as modificações.
— Fiquei pensando que a fonte realmente não está apropriada para uma festa de sua categoria, então achei melhor colocar a fonte Alexei Copperplate. No lugar dessas pombinhas, umas flores bem delicadas como esses lírios, por exemplo, fica muito mais romântico e digno de uma senhorita distinta e refinada — quando disse isso, Kimberly sufocou um sorriso, pois sabia que de distinta e refinada a senhorita Dvenau não tinha nada. Já ouvira algumas fofocas de alguns flagras dela com alguns rapazes, que na certa não eram o seu noivo.
Passados quinze minutos, o convite estava totalmente reformulado.
— Pronto, é assim que o seu convite vai ficar definitivamente — falou Kimberly enfatizando a palavra “definitivamente”.
A senhorita Devnau ficou olhando para a tela do notebook por alguns segundos antes de falar:
— Ficou realmente bom. Muito bom mesmo.
— É claro que ficou bom, — assegurou Kimberly com firmeza — não teria como não ficar, sendo feito por uma designer da Arts Designer. E digo, senhorita Dvenau: é bom para nós, e principalmente para você, que esse seja o último modelo de convite, porque nós temos prazos a cumprir e mesmo assim, porque o pessoal pode começar a achar que a senhorita está usando os convites como desculpa para adiar seu casamento, não é mesmo?
Os olhos verdes da senhorita Dvenau arregalaram-se, mas ela nada disse. Todos sabiam que ela estava se casando por interesse e não por amor.
— Estamos combinadas então, senhorita Dvenau? — Indagou Kimberly estendendo a mão para a jovem.
— Cl-claro — gaguejou a outra. — Está aprovado, pode mandar fazer os convites — respondeu apertando a mão de Kimberly.
— Então está bem. Gosto muito quando os clientes da Arts Designer saem satisfeitos.


Mais tarde, depois do expediente, enquanto se encontravam no lugar marcado, Brian exclamava impressionado.
— Não acredito que você fez isso! — Exclamou, enquanto tomava um gole de cerveja.
— Claro que fiz. O que mais queria que eu fizesse? A criatura não se decidia nunca! E ninguém aqui é trouxa que não saiba que ela não está nem um pouquinho feliz em se casar.
— É, mas e se ela falar o que aconteceu para o pai dela? — Perguntou Martin, outro colega de trabalho de Kimberly.
— Acha que ela vai abrir a boca? Seria uma vergonha para ela... — respondeu enquanto tomava um gole de cerveja.
A noite estava muito agradável, uma perfeita noite de terça-feira. Kimberly adorava quando saía à noite e podia sentir a brisa noturna.
            — Hum... dá para ver que você está muito bem, Kim — comentou Cristiano. 
            — É verdade, — falou enquanto espetava uma batata-frita — estou conseguindo superar isso de uma forma legal.
            — Você é muito guerreira, sabia Kim? — Comentou Evelin.
            — A gente faz o que pode — respondeu sorrindo.
            Comeram e beberam sem nada dizer, quando o silêncio começou a ficar pesado, Martin retomou o assunto.
            — Puxa, eu e os caras aqui — referiu-se a Evelin e Cristiano — achamos muito legal a atitude que teve com a Dvenau. Ninguém iria fazer melhor do que você, Kim.
            Kimberly balançou a cabeça e respondeu:
            — Não fiz nada de extraordinário, apenas fiz aquela loira burra entender que não pode ficar brincando conosco. Puxa, nós não somos como os “amiguinhos” dela, a gente trabalha duro para fazer as coisas com a melhor qualidade possível. O fato do pai dela estar toda a hora na empresa não justifica a arrogância dela.
            — É verdade — concordou Cristiano.
            Evelin e Penélope começaram a conversar sobre uma bolsa que Evelin tinha visto em uma loja do shopping, os rapazes começaram um assunto sobre a última partida de futebol do time de Cristiano e Kimberly virou a cabeça lentamente em direção a casa.
            “Quem será que morou naquela casa? E por que será que quer vender?” — Pensava absorta em seus pensamentos.
— Pois é, com uma colega de trabalho tão desligada desse jeito, eu sempre acabo falando sozinho... — a voz de Martin interrompeu seus pensamentos.
            — Que foi que você disse, Martin? — Perguntou Kimberly voltando à realidade.
            — Bah, cara... esquece. Não vai conseguir nada com a Kim desse jeito — disse Brian sorrindo.
            Kimberly sacudiu a cabeça e disse se desculpando:
            — Desculpa Martin, ando meio desligada. Não faça caso, eu já aterrisei.
            Martin bebeu um gole de cerveja e disse:
            — Bem, eu estava te convidando para sair comigo nessa sexta-feira, para irmos ao cinema.
            Ela pensou por um momento e respondeu em seguida:
            — Vamos sim, por que não?
            Os demais colegas ficaram quietos. Todos ali sabiam que Martin nutria um sentimento muito especial por Kimberly e que fazia de tudo para que ela ficasse com ele.
            — Só por favor, — começou Kimberly — não vamos ver nenhum filme maluco de guerra e nem de comédia, está bem?
            Ele sorriu, pegou a mão dela e respondeu:
            — Veremos o filme que você achar melhor. Você escolhe.
            — Hum... daqui a pouco nós vamos ter de fazer os convites de casamento desses dois, hein ? — Disse Penélope sorrindo.
            Pela expressão de Martin, estava claro que era isso que ele queria, mas não era isso que Kimberly demonstrou quando disse:
            — Acho que está meio cedo para a gente falar disso, né? — Disse delicadamente enquanto retirava a mão.
            Ela ia olhar para as unhas quando algo chamou sua atenção. Rapidamente virou o rosto em direção a casa. Tivera a nítida impressão que uma luz havia se acendido lá dentro.
            — Que foi, Kim? — Indagou Evelin.
            — Nada, não foi nada.
            Antes que mais um silêncio caísse sobre os seis, Cristiano disse:
            — Gente, nós precisamos sair mais, que acham?
            — Eu concordo — respondeu Evelin chegando mais perto dele. — A gente tem trabalhado demais e se divertido de menos. Puxa, somos novos, não é? O que vamos fazer depois que ficarmos velhos?
            — Eu vou fumar charuto e ouvir música clássica — respondeu Brian enquanto espetava uma batata-frita.
            — Acho que vou me dedicar ao ócio — disse Penélope.
            — Talvez eu e a Evelin estejamos cheios de netinhos... — disse Cristiano olhando para Evelin e a abraçando.
            Depois da declaração todos aplaudiram o que Cristiano disse e então Brian falou:
            — Puxa, depois dessa nem precisa dizer mais nada, hein? Acho que vai ser o casamento de vocês que a gente vai fazer os convites — fez uma breve pausa e perguntou. — E você, Kim, vai fazer o que quando ficar velhinha?
            Kimberly olhou para o céu estrelado e, depois de alguns segundos, respondeu de forma vaga.
            — Talvez eu não fique velha...
            — Boa resposta essa, hein? — Comentou Evelin. — Vai se matar fazendo plástica é? Para não ficar velha?
            — Não, não necessariamente isso — respondeu terminando de beber a cerveja. — Talvez eu não esteja mais viva até ficar velha... a gente nunca sabe o dia de amanhã...
            Todos ficaram quietos e ninguém ousou abrir a boca para rebater. Sabiam por que Kimberly agia daquela maneira de vez em quando, por isso a respeitavam.
            — Bem galera, tá na hora de ir embora, a gente tem que trabalhar amanhã, se lembram? — Comunicou Brian enquanto se arrumava para ir embora.
            — Puxa, é mesmo. Já são quase onze da noite! — Anunciou Evelin.
            Pediram a conta, quando esta chegou, dividiram e pagaram ao garçom. Kimberly estava colocando o casaquinho quando Martin disse:
            — Posso levar você em casa?
            Ela olhou para os olhos castanhos dele e respondeu:
            — Me leva sim, vou gostar muito.
            Os outros se arrumaram e, depois de se despedirem, tomaram rumos diferentes.
            No caminho para casa, Kimberly não falou muito com Martin, mas podia sentir que ele a olhava com atenção.
            “Poderia dar uma chance a ele...” — pensou enquanto chegava mais perto dele.
            Depois de terem descido do ônibus, Martin e Kimberly caminhavam devagar pela rua quase deserta.
            — Embora eu não trabalhe na mesma sala que você — começou Martin, meio tímido — acho que você é uma ótima profissional.
            Kimberly riu do elogio e disse:
            — Está dizendo isso para me agradar, né?
            — Não, estou falando sério mesmo. Já trabalhei em outras empresas e confesso que não vi ninguém da sua idade trabalhar como você. Parece até que você trabalha há muitos anos.
            — Bem, — ela respondeu sorrindo — trabalho na Arts Design há cinco anos, imagino que seja um bom tempo...
            Quando estavam se aproximando do prédio, Kimberly pegou as chaves na bolsa e respondeu subindo o degrau para entrar.
            — E, além do mais, é o que me resta, Martin. Tenho que me dedicar ao trabalho... não tenho mais nada, é o que sobrou.
            Ela ia colocar a chave no portão quando ele perguntou:
            — E o amor, Kim? Não tem mais lugar para ele, nem depois do que aconteceu?
            Ela suspirou, olhou bem nos olhos dele e disse:
            — Tem sim, Martin. Tem um lugar, mas talvez eu precise de mais um tempo para deixar um lugar reservado para ele, que acha?
            Ele não respondeu nada, se aproximou, passou a mão pelos longos cabelos pretos dela e a trouxe para perto de si. Abraçou-a com força. Gostaria de poder ficar com ela, de poder consolá-la, mas só podia fazer isso se ela mesma quisesse e se permitisse. Ergueu seu rosto e a beijou delicadamente nos lábios. Kimberly não ofereceu resistência, porque esperava por isso há alguns dias e sabia que, mais cedo ou mais tarde isso iria acabar acontecendo.
            — Bem, me avise então quando reservar um lugar para o amor — disse Martin com um sorriso afastando-se dela.
            — Pode ter certeza de que será o primeiro, a saber — retribuiu o sorriso e disse enquanto o olhava se distanciar. — Se cuida!


            “Eu não aprendo nunca...” — pensou Kimberly enquanto desligava a televisão — “é óbvio que não vai ter nada de legal na televisão, nunca teve...”
            Largou o controle remoto na mesa e ficou olhando para um ponto vazio a sua frente.
            Tinha total certeza de que vira uma luz se acender e apagar naquela casa ou estava vendo coisas?
            — Mas como pode ter alguém morando naquela casa se ela está vazia para vender? Será que é algum indigente? — Especulou consigo mesma.
            Levantou da cadeira e caminhou até a janela. A noite estava muito bonita e silenciosa. Já passava da meia noite, mas Kimberly não conseguia pegar no sono. A impressão de ter visto um resquício de movimento na casa a deixava intrigada.
            “A maioria das pessoas deve estar dormindo, calma e tranquilamente em suas camas... e eles também devem estar dormindo, dormindo um sono profundo e eterno...” — pensou enquanto deixava as lágrimas correrem livres pelo rosto...


Até a semana que vem,


domingo, 22 de março de 2015

O Ciclo das Sombras cap. 1/ pt.1

Olá Queridos Leitores!!

Depois de muito tempo sem postar, aqui estou eu.
Para aproveitar o retorno, decidi fazer uma coisa: se ainda tem alguém que acompanha o blog, a partir dessa semana, vou postar um pouquinho do Ciclo das Sombras ( o livro todo) assim, quem não leu tem a oportunidade de ler.
Mas já aviso aos navegantes: O LIVRO JÁ ESTÁ REGISTRADO NA BIBLIOTECA NACIONAL!!
Por isso não venham com a ideia de copiar a história e dizer que é sua. Abaixo seguem as informações referentes ao registro na Biblioteca.


Certificado de Registro ou Averbação. Meu primeiro livro está registrado sob os números: 515.632, Livro 978, Folha 8, 515.662, Livro 978, Folha 38 e 515.663, Livro 978, Folha 39. Da Biblioteca Nacional.



Michele Irigaray



O Ciclo das
Sombras

Início

1ª Edição




I68c    Irigaray, Michele 
                                                     O ciclo das sombras: início / Michele Irigaray. — Porto Alegre: Universo, 2010.
                     206 p.
     
       1. Romance   2. Vampiros – ficção   3. Literatura brasileira          I. Título
       
                                                           CDU : 82-31

    Bibliotecária responsável: Michele Irigaray Moisés Pedreira CRB/10-1832





Dedicatória



Dedico esta história às duas pessoas mais importantes da minha vida: meu marido Alexandre, por tornar o meu sonho realidade e meu filho Lucius, razão da minha vida, que vai conhecer a Kimberly e o Ulrich quando for maior.




Agradecimentos

Agradeço a todos aqueles que acompanharam o desenvolver da história de amor de Ulrich e Kimberly e deram o maior apoio para a história ficar pronta. Valeu pessoas!
Também quero agradecer ao Bibliotecário do Goethe Institut pela grande ajuda na revisão do idioma mais bonito de todos (para mim): o alemão.

                                                                           



O ciclo

O ciclo sem fim
Inicia, finda e torna a iniciar
Quando é que nessas voltas
Nós vamos nos encontrar?
O ciclo não espera,
Não se apieda de nós
Temos de acompanhá-lo
Antes que seja tarde demais
Nessas voltas,
Não me abandone e não me deixe só
Siga ao meu lado pela eternidade que temos
Seja meu companheiro, meu caminho
Minha salvação,
A verdade, a escolha do meu coração
Seja forte o bastante para comigo estar
Quando o ciclo recomeçar...



Michele Irigaray
30/08/2009





SUMÁRIO


Capítulo 1 ─ O ciclo sem fim .............................................  7
Capítulo 2 ─ Início, fim e recomeço ..................................  39
Capítulo 3 ─ Encontro .......................................................  77
Capítulo 4 ─ O começo do ciclo ........................................  101
Capítulo 5 ─ O caminho traçado ........................................  125
Capítulo 6 ─ O movimento do Destino .............................  141
Capítulo 7 ─ Sentimentos entrelaçados .............................  159
Capítulo 8 ─ Na escuridão da noite ...................................  174
Capítulo 9 ─ Direções opostas ...........................................  191








CAPÍTULO 1

O ciclo sem fim


            Era para ter sido assim. Tinha de ter sido assim, não havia nada que pudesse fazer para mudar. O Destino havia escolhido por ela. Era a sua sina...
            Kimberly pensava isso todos os dias quando acordava para ir ao trabalho. Nada muito diferente acontecia em sua vida desde que acabara a Faculdade de Design e conseguira o emprego na Arts Design. Era uma empresa muito bem conceituada no mercado e lhe rendia um bom salário no final do mês. Realmente muito bom. Bom o suficiente para pagar todas as contas do apartamento onde morava sozinha e ainda sobrar para se dar ao luxo de gastar em bobagens.
            “É...” — pensava enquanto ia de ônibus para a empresa — “para alguém com vinte e cinco anos está muito bom, muito bom mesmo. Um monte de gente gostaria de estar em meu lugar.” — Concluía, mas não com muito ânimo, pois ainda faltava alguma coisa, mas não sabia o que era.
            “E lá vamos nós... passar pela casa misteriosa de novo” — pensou enquanto olhava pelo vidro do ônibus e virava o pescoço até onde conseguia.
            A casa ficava situada bem à vista na avenida onde Kimberly passava todos os dias de ônibus. Era uma casa de três andares, estilo cabana, relativamente grande. Estava desocupada para vender.
            “A criatura que quer vender essa casa precisava fazer uma reforma antes...” — pensou voltando o corpo à posição normal.
            Kimberly adorava a casa. Não sabia o motivo, mas havia algo que a fascinava. O local onde a casa ficava também contribuía para aumentar o clima de mistério, pois ficava afastada das demais moradias. Era como se a vizinhança quisesse manter uma distância bastante significativa dela. As únicas coisas que existiam por perto eram alguns pinheiros e uma figueira muito velha que ocupava uma grande área do terreno, no qual uns poucos capins cresciam perto de suas raízes. Mais adiante, havia uma igreja simples que estava sempre aberta, mas vazia na maioria das vezes, exceto aos domingos, em função da missa das dezoito horas.
            “Duvido que alguém queira comprar uma casa dessas...” — concluiu enquanto levantava-se para descer do ônibus.


            — E aí, colega! — Gritou Brian quando viu Kimberly passar pela recepção da empresa. — O chefe está louco conosco!
            — Que foi que disse? — Indagou sem entender nada.
            Brian correu até Kimberly e disse ajudando a segurar os livros que ela carregava.
            — Isso mesmo que você ouviu. O chefe quer dar uma olhada detalhada no convite de casamento que fizemos para aquela madame. Ela ligou para ele reclamando que colocamos a fonte errada.
            Kimberly franziu o cenho e disse enquanto entrava no elevador.
            — Não dá pra acreditar, a gente mostrou pra ela como é que ia ficar antes de tomar qualquer decisão e ela aceitou!
            — Pois então, — disse Brian saindo do elevador na frente de Kimberly — eu disse isso pro “adorado chefe” e ele falou a mesma frase de sempre.
            — O cliente tem sempre razão! — Disseram Kimberly e Brian ao mesmo tempo e, em seguida, começaram a rir.
            Caminharam até a sala onde trabalhavam e, nem bem sentaram em seus lugares, Penélope entrou agitada com cara de assombro.
            — Já contaram a novidade? — Indagou a Kimberly. — Ninguém merece.
            Kimberly passou a mão pelos longos cabelos pretos e disse:
            — Bem, vamos falar com o chefe e ver o que é que o cliente está reclamando então.
            — Pior, essas dondocas que se acham as tais são uma ameaça para designers como nós — falou Brian em tom cômico.
            — Vamos lá então — disse Kimberly suspirando.


            Quando chegaram à sala de Vilton, ele disse:
— A senhorita Dvenau disse que a fonte está completamente errada — comunicou estressado. — Ela quer Nuptial e não Amazone BT! Será que é tão difícil assim? É só uma fontezinha de nada!
            — Até pode ser uma fontezinha de nada, mas ela adorou quando viu a prova do convite escrito com a Amazone! — Disse Penélope em tom alterado.
            — Eu não sei chefe, — começou Brian — mas esse pessoal ultimamente anda mais perdido do que cego em tiroteio. Não consigo entender, ela tinha A-DO-RA-DO a fonte! Disse-nos que nunca vira convite tão lindo!
            — É, — concordou Vilton — vai ver que ela viu outro convite em outro lugar e resolveu mudar.
            Como ninguém disse mais nada, Kimberly concluiu:
            — Se essa senhorita Dvenau continuar assim até o dia do casamento vai acabar ficando com um convite que não tem nada a ver com o que ela queria originalmente. Essa já é a terceira vez que a gente muda a droga da fonte. Quer dizer, a mulher não sabe o que quer e parece que é a gente que não sabe trabalhar. Eu não fiquei quatro anos na faculdade para ficar me estressando com esse tipo de cliente. Não mesmo, ninguém merece! — Disse e saiu da sala do chefe, batendo a porta atrás de si.
            “Realmente esse não era um dia para sair da cama”— pensou enquanto sentava-se à mesa de trabalho e apoiava a cabeça nas mãos.
            Alguns minutos depois, Brian e Penélope entraram na sala com cara de poucos amigos. Sentaram em suas respectivas mesas e permaneceram calados por algum tempo.
            — E aí? — Indagou Kimberly.
            — Vamos ter de ligar para a madame e perguntar a ela o que quer afinal de contas — respondeu Brian e ficou olhando para ela.
            Kimberly retribuiu o olhar e fez um gesto de quem pergunta: “Sim, e daí? O que é que eu faço?”
            O silêncio seguiu-se e ela deduziu:
            — Certo, ligarei para a “senhorita não-sei” e vou ver o que posso fazer. A única coisa que eu sei é que temos de entregar esses malditos convites para o final da semana que vem. Ou ela se decide dessa vez, ou então vamos entregar qualquer coisa.
            — É. Só que ela é filha do cara que mais faz trabalhos aqui conosco... — lembrou Penélope.
            Kimberly assentiu com a cabeça e suspirou. Era verdade, não dava para tratar a senhorita Dvenau rudemente, caso contrário, ela iria dar queixa ao pai e, provavelmente, o resultado disso seria um rebaixamento em seus salários.
            Respirando fundo, Kimberly pegou o caderninho de telefones dos clientes que estava em sua mesa e procurou o telefone da senhorita Dvenau, discou o número e aguardou por algum tempo.
            — Alô, eu poderia falar com a senhorita Dvenau, por favor?
            Mais alguns minutos de espera e alguém atendeu o telefone.
            — Bom dia senhorita Dvenau, aqui é Kimberly Longaray da Arts Design. Gostaria de marcar uma hora com você para discutirmos, afinal de contas, qual será a fonte usada em seu digníssimo convite de casamento — falou a palavra digníssimo gesticulando afetadamente fazendo com que Brian e Penélope contivessem o riso.
            Segundos depois:
            — Perfeito, então amanhã às duas da tarde eu aguardo a senhorita. Muito obrigada e tenha um bom dia.
            Depois de pôr o fone no gancho, olhou para os colegas e disse:
            — Amanhã ela não me escapa. Vai ver o que é que é um verdadeiro trabalho de design.
            Brian e Penélope se olharam e ninguém disse mais nada. Quando Kimberly falava assim, então o problema estava resolvido.
O resto do dia foi tranquilo. Não houve mais nenhum tipo de reclamação de nenhum cliente. Kimberly ficava feliz quando isso acontecia, pois gostava quando recebia elogios sobre seus trabalhos. Sentia-se útil e sabia que alguém valorizava o que ela mais gostava de fazer: criar.


A volta para casa foi calma, Kimberly sentia-se um pouco cansada, o que não era normal para uma segunda-feira, mas atribuía tal fato ao pequeno probleminha que havia acontecido com relação ao convite de casamento. Porém, tal fato não a incomodava, tinha um plano em mente e queria ver a expressão no rosto da senhorita Dvenau quando visse o que ela faria.
“E lá vamos nós de novo” — pensou enquanto virava o rosto para olhar a casa abandonada. — “Boa noite casinha e até amanhã” — cumprimentou Kimberly sorrindo e voltando a olhar para frente.
Quando chegou a casa, atirou a bolsa em cima de uma cadeira que havia ao lado da porta. Caminhou até o quarto e tirou os sapatos, em seguida foi para o banheiro onde prendeu os cabelos em um coque e abriu o chuveiro. Tirou a roupa, jogou-a no cesto de roupa suja e entrou debaixo da água quente. Enquanto tomava banho, refletia sobre o dia que tinha tido. Era tão normal e sem graça... Se não fosse por seus colegas de trabalho tudo seria uma monotonia insuportável. Fazia sempre as mesmas coisas, do mesmo jeito. Não havia novidades, mudanças em sua vida.
— Aliás, — começou falando para si — nunca mais houve novidades depois daquilo...
Fechou os olhos com força para evitar o choro, mas era impossível. Ainda era muito recente e ela não conseguia se controlar. Chorou como sempre chorava quando se lembrava do que havia acontecido, era cruel demais, triste demais.
Após dez minutos embaixo da água quente, Kimberly saiu do box e pegou a primeira toalha que estava ao alcance, enxugou-se e voltou ao quarto. Abriu a porta do guarda-roupa e tirou uma camisola preta, vestiu-a e, depois de pentear os cabelos, foi para a cozinha preparar um lanche. Enquanto esquentava o leite, ligou o aparelho de som e colocou seu cd preferido para ouvir. Ficou cantando junto com a música enquanto esperava o leite ferver. Assim que ferveu, preparou o achocolatado e um sanduíche e foi para a sala. Comeu em silêncio e de repente lhe veio à mente uma ideia. Poderia parecer obsessão, mas não custava tentar. Após ter terminado de comer, levou a louça suja para a pia e encaminhou-se até o computador, ligou-o e conectou-se à Internet. Precisava fazer uma busca.
Acessou um site de busca e digitou JANES IMOBILIÁRIA. O resultado da busca deu nulo, mas Kimberly não desistiu, tentou novamente: ADMINISTRAÇÃO JANES. Novamente o vazio.
— Mas que droga! — Falou sozinha. — Que porcaria... deve haver um site dessa imobiliária! Tem que ter um!
Cruzou os braços e ficou séria olhando para a tela do computador. Tentava imaginar qual seria o site da imobiliária que estava vendendo a casa.
— Vamos pelo jeito mais difícil então... — suspirou e em seguida digitou IMOBILIÁRIA.
A lista de imobiliárias que apareceu no resultado da busca foi assustador, mas quando Kimberly colocava uma ideia na cabeça, não descansava enquanto não conseguia resolver o problema.
 Olhou site por site sem achar o que queria. Já estava ficando chata a tal busca que resolvera fazer, mas ainda tinha esperanças de que conseguiria atingir seu objetivo.
Foi depois da décima página, quando estava começando a desistir da ideia idiota que tivera que encontrou o que procurava: IMÓVEIS E LOCAÇÕES JANES LTDA. Seu coração quase parou de contentamento. Imediatamente clicou no link em que dizia VENDAS. Em seguida abriu uma janela com o endereço de vários imóveis para vender e selecionou apenas casas. Depois de alguns segundos apareceu na tela uma lista de casas que a imobiliária tinha para vender. Ao lado do endereço das casas havia um ícone de uma máquina fotográfica que indicava que havia fotos disponíveis do imóvel para ver. Passou os olhos por muitas casas até finalmente encontrar a que procurava.
— Já não era sem tempo! — Exclamou um pouco mais animada. — Vamos ver então como é a casa por dentro. Espero que não seja tão malcuidada por dentro quanto é por fora.
Clicou no ícone da máquina fotográfica e uma mensagem apareceu na tela: IMAGEM NÃO DISPONÍVEL.
— Mas que diabos! — Praguejou batendo com a mão na escrivaninha e tamborilando os dedos nela. — Ninguém merece, perdi mais de uma hora tentando achar esta porcaria, quando encontro, a foto não está disponível. Brincadeira!
Resolveu desligar o computador, seu plano havia falhado.

Sem alternativas, voltou para a cozinha, preparou mais um achocolatado e depois foi lavar a louça. Tinha que deixar a casa em ordem para o dia seguinte, porque se ela não limpasse ninguém mais o faria.



Bem, por hoje era isso. Espero que tenham gostado. Semana que vem tem mais.
Abraços e até a próxima!