Após muito tempo,cá estou eu publicando mais uma parte do primeiro capítulo. Espero que gostem.
Cap. 1/ pt. 6
Permanecia quieta durante o
trajeto de volta para casa quando uma ideia lhe surgiu de repente:
“E
se eu descesse na parada da casa e fosse dar uma voltinha só pra ver como é?”
Parecia
algo sem pé nem cabeça, mas não custava nada tentar. O máximo que iria
acontecer era não passar do portão de ferro e ter de voltar para casa no
próximo ônibus.
“Vamos
lá então...” — disse enquanto se levantava e acionava o sinal para descer. — “O
que parece eu com esta cesta de piquenique descendo aqui nesta parada. Parece a
Chapeuzinho Vermelho indo visitar o Lobo... — pensou rindo do pensamento que
teve.
Desceu
na parada vazia. Olhou ao redor e não viu ninguém. Por um momento ficou
indecisa, mas decidiu seguir em frente, não tinha descido do ônibus só para ter
que esperar o próximo ônibus. Seria idiotice.
A cada passo
que avançava, Kimberly sentia o coração acelerar. Era uma sensação muito estranha,
como se ela fosse encontrar alguma coisa na casa abandonada.
Caminhou até
chegar às grades de ferro. Com a mão livre, segurou a grade enferrujada como se
estivesse buscando apoio para não perder o equilíbrio. Permaneceu assim por
algum tempo tentando entender o porquê estava ali parada.
“Doida, doida,
doida...” — pensou consigo mesma. — “O que eu estou fazendo aqui, nervosa desse
jeito? É só uma casa aband...” — parou o pensamento, pois sentiu que havia algo
errado ali.
Havia alguém
atrás da janela do terceiro andar... a sensação de estar sendo observada ficou
muito forte e Kimberly desviou o olhar da casa e olhou para a sua mão agarrada
à grade de ferro.
“Preciso sair
daqui...” — pensou, mas sua mão não aliviou nem um pouco o aperto na grade.
Parecia ter colado a mão ali para sempre.
Tornou a olhar
para a janela. Olhando mais atentamente percebeu que não havia nada além do
vento brincando com as cortinas.
— Imaginação
absurda — disse para si mesma.
Aos poucos,
conseguiu abrir a mão e soltar a grade, mas a sensação de que estava sendo
observada ainda era muito forte.
Kimberly
continuou parada em frente ao portão por mais alguns minutos. Não sabia se
entrava ou se ia embora. Olhou mais uma vez para a casa e depois lançou o olhar
para o terreno a frente. O capim crescera e se espalhara pelo que fora antes um
jardim. O caminho que levava até a entrada da casa havia desaparecido há
tempos.
— Vou deixar
para bancar o Indiana Jones outra hora — falou para si mesma — pode ter um
bicho por aí e eu não quero me assustar mais do que já estou.
Suspirou e deu
meia volta. No terceiro passo ouviu algo que fez seu sangue gelar nas veias.
Parecia uma respiração. Uma respiração lenta e pesada bem atrás dela, por cima
do ombro direito. A certeza de que, agora, tinha alguém ali, deixou-a
paralisada de pavor. Não havia muito a fazer, ou ela se virava e verificava o
que era ou então permaneceria ali por um bom tempo, até que pudesse se
controlar mais.
Uma brisa
suave passou por ela fazendo-a sentir um leve perfume doce amadeirado. Kimberly
inspirou profundamente o perfume e pensou:
“Deus, que
cheiro bom! Deve custar uma fortuna um perfume destes.”
Mal terminou
de pensar isto e se assustou de novo. Se não havia ninguém por perto, como
poderia haver um perfume como se realmente
houvesse alguém ali, com ela?
“Chega, é
agora ou nunca” — pensou virando-se bruscamente.
Não encontrou
nada nem ninguém, só o portão fechado, o jardim malcuidado e o silêncio da
casa.
“Eu disse que
não tinha nada”— pensou suspirando aliviada. — “Estou ficando doida. Está na
hora de voltar para a casa.”
Kimberly não
almoçou quando chegou a casa. Estava cansada como se tivesse corrido
quilômetros sem parar. Ela não imaginara que a visita a casa resultasse em um
pré-ensaio de ataque cardíaco. Nunca ficara tão assustada e seu coração nunca
batera tão rápido como batera quando ela podia jurar que realmente havia alguém
atrás dela.
— Eu disse que
tinha algo estranho na casa — falou para si mesma.
De repente,
Kimberly não sabia o que fazer. Era sábado e ela não tinha plano algum. Não
tinha amigos para sair, não tinha parentes para visitar, não tinha familiares
para conversar... não tinha ninguém além do tio que visitava quinzenalmente.
Atirou-se no sofá da sala e falou em voz alta:
—Talvez eu
devesse comprar um bicho de estimação e me entreter um pouco... sair para
passear com ele... levar ao veterinário... limpar a sujeira que fizer no
apartamento... — parou por um momento e decidiu. — Não. Decididamente, um bicho
de estimação está fora de cogitação.
Tentou se imaginar
brincando com um cachorrinho. Chegou a rir da situação, mas mesmo que tivesse
condições de sustentar o bichinho, não tinha paciência para cuidar dele. Seria
um caos chegar todas as noites e ter de limpar a sujeira que ele faria enquanto
ela estivesse fora ou ter de sair para passear mesmo em dias chuvosos e frios,
porque o bichinho iria querer sair para fazer as suas necessidades. Não,
realmente não era uma boa ideia.
Recostou a
cabeça no sofá e fechou os olhos. A primeira imagem que lhe surgiu foi a casa:
quieta, silenciosa e abandonada... Tinha que haver alguma coisa estranha com
aquela casa... não era normal... Será que havia mendigos morando nela? Se
houvesse, como explicar aquela sensação terrivelmente forte de que alguém
estivera ali com ela? Mendigos não eram sorrateiros e, sem dúvida nenhuma, não
cheiravam a perfume importado.
— Deus do
céu... chega disso — falou como se estivesse conversando com alguém. — Eu estou
loquiando. Isto não é normal... essa obsessão por essa casa...
Abriu os olhos
e se inclinou para frente para apoiar a cabeça nas mãos. Aquilo tinha que
parar, estava ficando doentio.
— Vou acabar
fazendo companhia para o meu tio assim...
Balançou a
cabeça como se quisesse eliminar tal pensamento. Mas o que poderia fazer? Há
seis meses ela não tinha vida social. Só ia de casa para o trabalho e do
trabalho para casa. Não falava com mais ninguém a não ser seu tio e os colegas
de trabalho, quando estava na empresa. Precisava iniciar algo diferente, não
podia desperdiçar sua juventude e sua vida desse jeito. Sua família tinha
morrido, mas ainda havia Douglas, e ela deveria ser forte pelos dois,
principalmente quando seu tio recobrasse a razão e percebesse a verdade dos
fatos. Kimberly precisava estar lá para ampará-lo.
Mas ainda
assim, era esquisito. Era esquisito que uma casa pudesse chamar tanto sua
atenção. Kimberly era muito racional para a maioria das coisas que lhe
aconteciam, mas sabia que havia alguma coisa além do racional naquela moradia.
O que acontecera pela parte da manhã não era normal. A sensação de que tinha
alguém ali, observando-a, era muito palpável e ela ia sim investigar o que é
que estava acontecendo. Não importava o tempo que levasse e isso era o que ela
mais tinha no momento: tempo.
Sem ter o que
fazer durante o resto do sábado, Kimberly arrumou a casa pela terceira vez na
semana. Quando o relógio marcou vinte e duas horas, tudo já estava organizado.
Não restava mais nada a não ser tomar banho e ir dormir.
Depois que
deitou, Kimberly demorou a pegar no sono. Muitas imagens passavam em sua mente.
A lembrança de Martin passeando com ela no shopping, a visita que fizera ao
tio, a expedição doida a casa, a sensação de... Com esse pensamento, Kimberly
finalmente dormiu. E sonhou.
Estava
novamente parada em frente a casa. O dia estava terminando e o sol se pondo. O
silêncio era esmagador e não havia ninguém pelas redondezas. Então, ela soltou
a grade de ferro, virou-se e caminhou para longe, mas não pôde seguir adiante
porque a mesma respiração que sentira de manhã estava ali, de novo, sobre o seu
ombro direito.
Anoitecia
rapidamente e a escuridão tomava conta de tudo. O medo de antes triplicara e
Kimberly sentia o coração doer de tanto bater forte.
“Não
posso me virar” — pensou no sonho. — “Não estou mais corajosa como antes... vou
morrer de medo.”
A presença era
muito forte. Kimberly tinha certeza de que não estava sozinha.
Paralisada de
pavor, Kimberly começou a ficar tonta e se deu conta de que iria desmaiar se
não voltasse a respirar. Aspirou o ar com dificuldade e, quando pensou ter
normalizado a respiração, sentiu o perfume doce amadeirado muito forte.
Tonteou, perdeu o equilíbrio e, se não fosse pelas grades de ferro, teria caído
de costas.
Suspirou
aliviada e, por um momento, fechou os olhos. Mas havia algo errado ali, ela não
estava apoiada no portão de ferro. De regra, portões de ferro não têm contornos
humanos. Ela havia encostado-se a alguém. Alguém alto, forte e maciço como um
portão de ferro. O terror que tinha se dissipado voltou com intensidade e,
quando Kimberly ia juntar forças para se afastar, sentiu dois braços em torno
de sua cintura e duas mãos pálidas entrelaçaram-se a sua frente, impedindo-a de
se mover.
A respiração
ficou mais forte em seu ouvido. Kimberly ia preparar-se para gritar quando de
repente não estava mais de costas para quem quer que fosse e sim de frente. Ela
girou tão rápido que fechou os olhos com força temendo ver um monstro. Os
braços em torno dela estreitaram-se mais e o perfume doce invadiu seu nariz,
deixando-a tonta. Lentamente, abriu os olhos e o que viu a fez perder o fôlego.
Diante dela
havia um homem. Pálido e muito bonito, parecido com aqueles modelos de
passarela. Seus traços eram finos e firmes ao mesmo tempo e o seu olhar fez com
que Kimberly, por um momento, esquecesse quem era e onde estava. Eram verdes,
mas não um verde comum. Eram verdes quase azuis e eram tão brilhantes...
Kimberly sustentou o olhar e abriu a boca para dizer alguma coisa, mas o som
não saiu e ela começou a ofegar.
Ele a apertou
mais contra os braços fortes e falou com uma voz grave e em alemão:
— Gute Abend meine Liebe. (Boa noite minha
querida).
Kimberly
sentiu um arrepio percorrer seu corpo como uma corrente elétrica. Ele era tão
lindo, não parecia real e aqueles olhos... eram hipnóticos.
“O que foi que
ele disse mesmo?” — Pensou tentando organizar os pensamentos.
Mas não
conseguiu. Ele sorriu para ela de um jeito enigmático, fazendo-a desfalecer em
seus braços e, quando ele ia se aproximar mais dela, provavelmente para
beijá-la, Kimberly viu algo que a fez arregalar os olhos. Atrás dele,
abriram-se duas asas enormes de morcego e, na mesma hora, ela soube que eram
dele. Gritou com todas as forças:
— Não! ─
Gritou assustada enquanto acordava e sentava-se na cama.
Até a próxima!