Segue o Capítulo 2, parte 2 do Ciclo das Sombras.
No dia seguinte Kimberly acordou
atrasada. O relógio tinha despertado às seis e meia, mas ela só foi acordar às
sete e quinze. Levantou de um salto da cama e tentou fazer tudo o que fazia
antes de ir trabalhar em quinze minutos, pois tinha que pegar o ônibus às sete
e meia. Tomou banho, se arrumou, tomou café o mais rápido que pôde e, antes de
sair de casa, olhou-se no espelho que havia perto da porta de entrada do
apartamento. Levou um susto e recuou alguns passos para trás.
Estava
horrível, parecia que não tinha dormido a noite toda e estava com olheiras bem
acentuadas, sem falar que, ao se dar conta do fato, sentiu uma tontura tão forte
que teve de se sentar na cadeira que havia ao lado da porta de entrada.
—
Deus... — murmurou enquanto passava a mão pelos cabelos — o que foi que
aconteceu ontem à noite? Estou horrível e não me sinto nada bem...
Levantou-se
da cadeira devagar, temendo sentir-se tonta de novo. Pegou a bolsa e saiu do
apartamento lentamente. Quando chegou ao saguão de entrada, parou subitamente
quando se lembrou:
—
A pasta do projeto! Não acredito que esqueci!
Deu
meia volta para tentar pegar o elevador quando o mesmo fechou a porta e subiu.
Alguém o tinha acionado antes. Dessa forma, Kimberly teve de esperar o elevador
subir e descer de novo até que pudesse ir ao andar que queria. Olhou no relógio
e viu que já passava das sete e quarenta. Estava mais do que atrasada e já não
poderia mais pegar o ônibus de sempre. Olhou para o marcador do elevador e
constatou que ele estava parado no décimo andar. Passaram alguns segundos e ele
continuava parado, então Kimberly decidiu subir correndo as escadas. Como
morava no quinto andar, não teria muitos degraus para subir e, com certeza,
chegaria primeiro no apartamento se não esperasse pelo elevador. Saiu em
disparada pelas escadas e, quando finalmente chegou à porta do apartamento,
teve de se apoiar na parede para recobrar o fôlego. Estava exausta, o que era
estranho, pois ela não se cansava facilmente. Já subira aqueles cinco andares
correndo várias vezes e nunca se sentira tão cansada e fraca como se sentia
agora. Tinha alguma coisa estranha acontecendo.
Abriu
a porta novamente e pegou a pasta que deixara em cima da mesa. Nem esperou pelo
elevador e desceu correndo as escadas. Só foi parar de correr quando chegou à
parada. O relógio marcava oito e dez.
“Droga,”
— pensou desanimada — “detesto chegar atrasada, ainda mais hoje que eu tenho um
monte de coisas para fazer... que quarta-feira horrível...”
O
ônibus chegou as oito e trinta e cinco em frente à Arts Design.
Quando
Kimberly chegou em sua sala, seus colegas encontravam-se reunidos e logo vieram
saber o que é que tinha acontecido. Era algo totalmente improvável o fato de
Kimberly se atrasar no serviço.
—
O despertador tocou, mas eu não ouvi... — dizia enquanto largava suas coisas
sobre a mesa. — E quando eu estava pronta para sair, percebi que tinha
esquecido a pasta mais importante da minha vida em casa... e o elevador não
ajudou, quando eu fui entrar, alguém o chamou antes e eu perdi mais uns
preciosos minutos esperando. Como ele não vinha nunca, decidi subir as escadas
correndo. E, nessa correria toda, só peguei o ônibus às oito e vinte... bem
certinho. Era assim mesmo que eu queria começar minha quarta-feira — terminou
sentando-se na cadeira e respirando fundo.
Penélope
que estava perto da amiga falou baixinho para que Brian não ouvisse:
—
Além desse atraso todo... o que foi que aconteceu com você? Você está com um
semblante terrível... parece que não dormiu a noite toda! Quer um chá ou um
café?
Kimberly
ajeitou os cabelos com as mãos e respondeu:
—
Acho que sim, um chá ia me fazer bem. Na verdade, eu dormi a noite toda,
realmente não sei o que foi que me deixou assim, tão cansada...
O
resto do dia passou muito rápido e Kimberly nem viu o tempo passar, pois se
dedicou exclusivamente ao projeto da loja e não desviou a atenção para mais
nada que não fosse o projeto.
No
final da tarde, antes de terminar o expediente, Vilton foi até a sala de
Kimberly e disse:
—
Kim, posso falar com você um instante?
—
Claro, — respondeu enquanto organizava os papéis.
Assim
que terminou de juntar e colocar os papéis do projeto dentro da pasta,
dirigiu-se à sala do chefe. No caminho, pensou:
“O
que será que aconteceu? Será que ele vai me dar uma letra porque eu cheguei
atrasada hoje? Será que vai me despedir? Ai, meu Deus...”
Logo
que entrou na sala de Vilton, ele disse:
—
Sente-se Kim, precisamos conversar.
Ela
não aguentou mais e começou:
—
Sobre o atraso, peço mil desculpas, não foi intenção minha. Prometo que...
—
Calma — disse Vilton interrompendo-a. — Não é nada disso. Sossegue um pouco,
você tem a mania de se preocupar com as coisas sem nem ao menos saber do que se
tratam.
No
mesmo momento, Kimberly se acalmou e ficou ouvindo o que o chefe tinha a dizer.
—
Eu a chamei aqui, porque preciso dizer algumas coisas importantes que só posso
dizer pra você.
Kimberly
não estava entendendo nada.
—
Bem, em primeiro lugar, gostaria de dizer, sem puxar o saco, que você é a minha
melhor funcionária desde que entrou aqui. Todos os seus colegas são
maravilhosos também, são perfeitos, mas não são a perfeição que eu procuro.
Você sim, além de saber o que está fazendo, você faz o seu trabalho com emoção.
Eu observo a dedicação com que você executa cada tarefa que lhe é passada. A
criatividade, então nem se fala.
Kimberly
estava ficando de boca aberta com tantos elogios. Chegara à sala de Vilton
temendo o pior e ele só lhe dizia coisas boas. Tinha que parar imediatamente
com a mania de esperar sempre pelo pior. Havia coisas boas na vida.
—
Vi o que você fez com relação à senhorita Dvenau. Foi simplesmente maravilhoso,
ninguém teria feito melhor. Ela simplesmente não reclamou mais do convite e eu
fiquei sabendo depois que ela comentou com o pai que achou o convite perfeito e
muito lindo. Elogiou um monte os serviços que nós prestamos a ela.
Kimberly
ouvia com atenção cada palavra que Vilton dizia. Ficava orgulhosa consigo mesma
por saber que era capaz de prestar um serviço com qualidade.
—
Então, — continuou ele — por isso, por toda a sua dedicação, estou oferecendo
um cargo mais alto para você.
Kimberly
não pôde deixar de se admirar, não imaginara que fosse ouvir o que ouviu.
—
Então, aceita?
—
Cl-claro que sim — gaguejou. — Ficarei lisonjeada e muito contente por saber
que meu trabalho é importante e pode contribuir de alguma forma aqui, na
empresa. — Terminou com um largo sorriso.
Vilton
também sorriu e disse:
—
Que bom que você gostou. A primeira coisa que vai ser alterada é o seu salário.
Depois vou puxar uma linha de telefone da minha mesa até a sua para que,
qualquer coisa que eu precisar, eu possa entrar em contato com você. Com
relação a sua mesa, imaginei deixar tudo como está, porque penso que você não
iria querer ficar isolada dos seus colegas e nem eles de você — fez uma breve
pausa e disse — percebi que vocês seis são muito amigos e não seria justo se eu
desmanchasse isso.
Kimberly
não cabia em si de tão feliz que estava.
—
Estamos combinados então, Kim? — Perguntou Vilton.
—
Estamos sim, senhor. Agradeço muito a oportunidade que está me oferecendo, com
certeza, não vai se arrepender.
Ela
ia sair da sala quando ele lhe disse, enquanto se levantava e caminhava em sua
direção:
—
Ah... mais uma coisa Kimberly. — Parou na frente dela e disse. — Sei que não
sou seu pai nem nada parecido. Sei que você tem passado por maus momentos e,
por isso, digo que você pode contar sempre comigo. Imagino que os seus colegas
também devem ter dito isso a você, então, sendo assim, fica mais um pra se
preocupar. Procure não exigir demais de você e não se culpe tanto. Atrasos
acontecem, não faça disso uma tempestade em copo d’água. Se quiser, pode vir
trabalhar somente à tarde. Tenho a observado e acho que você anda meio cansada
ultimamente.
Kimberly
não esperava ouvir isso dele. Ficou meio sem jeito e tentou responder algo
coerente.
—
Está bem, senhor. Vou procurar não me cobrar tanto. Talvez esse meu cansaço
todo seja mesmo muita cobrança. Vou cuidar melhor disso e muito obrigada por
tudo — disse enquanto saía da sala e ia para a sua.
Quando
chegou, os seus colegas já tinham ido embora. Com calma, continuou a organizar
o restante dos papéis que deixara sobre a mesa. Quando estava com tudo pronto,
Martin surgiu na porta e disse animado.
—
Olá colega, preparada para a visita importante? — Perguntou sorridente.
Ela
lhe lançou um sorriso animado e respondeu:
—
Claro que sim, só estava organizando a papelada para amanhã. Mas já estou
saindo.
Pegou
a pasta do projeto e acompanhou Martin até o elevador. Quando chegaram ao
saguão de entrada, o primo de Martin já os esperava.
—
Olá Rogério! — Cumprimentou Martin. — Esta aqui é a Kimberly, minha colega de
trabalho. Ela quer ir conosco visitar a casa.
Kimberly
surpreendeu-se quando viu Rogério. Ele era muito parecido com Martin e, se não fossem primos, ela diria
que eles eram irmãos devido à semelhança entre eles.
—
Olá, tudo bem? Fiquei curioso com relação à casa, deve ser muito linda mesmo. O
Martin me falou que você tem verdadeira adoração por ela.
—
É — respondeu meio sem jeito — acho a casa mesmo muito bonita.
—
Bem, — disse Rogério — o que estamos esperando, vamos lá. Vamos pegar o carro.
Seguiram
o primo de Martin até um estacionamento que havia próximo à empresa. Assim que
se acomodaram no veículo, Rogério deu a partida e disse para o primo:
—
Martin, sabe qual é o melhor trajeto para chegar até a casa?
—
Sei, mas você não tem que pegar as chaves antes na imobiliária?
—
Eu já fiz isso antes para que nós não perdêssemos tempo.
—
Ô beleza, isso é que é eficiência — respondeu Martin sorrindo e em seguida
começou a explicar o trajeto ao primo.
O
coração de Kimberly batia acelerado. Esperara e desejara por um momento como
esse há muito tempo e, agora que iria finalmente conhecer a casa, estava
ansiosa demais.
“Estou
parecendo o meu tio naquele sábado quando cheguei com o lanche...” — pensou
sorrindo.
Rogério
estacionou em frente a casa e desceu do carro. Foi até o portão de ferro e o
abriu para poder estacionar o veículo no pátio. Após ter estacionado o carro,
disse para os outros:
—
Bem pessoal, podemos descer agora. Vamos ver como a casa está por dentro.
Todos
desceram em silêncio. Instintivamente, Kimberly se aproximou mais de Martin,
que colocou o braço em torno dos ombros dela. Caminharam até a porta de entrada
e aguardaram Rogério abrir a porta.
—
A corretora me disse que a chave tinha algum problema para abrir, mas que se eu
ficasse com a casa, eles dariam um jeito — disse enquanto forçava a chave na
porta.
Rogério levou mais alguns segundos tentando
abrir a porta. Por um momento, Kimberly achou que ele iria quebrar a chave e
que tudo estaria perdido, mas respirou aliviada quando a porta, finalmente,
abriu.
— Aleluia! —
Disse Martin sorrindo. — Não viemos aqui em vão, não é?
— Você e suas brincadeiras. Não
mudou nada, não é primo? — Indagou Rogério enquanto entrava na sala.
Martin
entrou logo atrás do primo e Kimberly o seguiu. Quando colocou os pés na sala,
seu coração quase saltou para fora da boca. O que ela estava vendo ou tentava
ver, pois a sala estava imersa na escuridão, era exatamente o que ela tinha
visto no sonho da noite anterior. Não havia o que tirar nem pôr. Ela tinha os
detalhes da sala tão nítidos em sua mente que não esperou por mais ninguém,
saiu caminhando por entre os móveis e foi direto na direção do interruptor de
luz.
—
Será que alguém saberia dizer onde está o interrup... — disse Rogério, mas sua
frase morreu antes de terminar, pois Kimberly tinha acendido a luz naquele
instante.
—
Como... como conseguiu achar o interruptor de luz sem bater em nada, Kim? —
Indagou Martin impressionado.
—
Sei lá, — respondeu — acho que foi intuição. Ninguém se machucou não foi?
—
Não... — responderam Martin e Rogério surpresos.
Com
a luz acesa, Kimberly pôde olhar melhor para a sala. Era muito bonita e
decorada com um gosto refinado. Só não conseguiu entender o motivo de uma casa
estar para vender com todos os móveis dentro. Normalmente isso só acontecia
quando era para alugar.
—
Olhem só que sala mais bonita. — Dizia Rogério enquanto observava atentamente
cada detalhe dos móveis. — O pessoal da imobiliária me falou de alguns móveis,
mas não me disse que a casa viria mobiliada.
—
Rogério? — Chamou Martin.
—
O que foi? — Respondeu Rogério curioso.
—
O que foi que o pessoal da imobiliária falou sobre esta casa? — Perguntou
parado no meio da sala.
—
Eles disseram que pertenceu a um homem muito rico, mas que havia falecido
bruscamente em um acidente de carro. Não tinha familiares, apenas parentes
muito distantes que resolveram vender a casa, porque não queriam ficar com mais
uma preocupação. Sabe como são essas coisas... IPTU, coisas para arrumar...
tudo isso é um gasto desnecessário se a casa não tiver utilidade.
—
E as criaturas quiseram até se livrar dos móveis também? — Indagou mostrando
com a mão todos os móveis da sala.
—
Olha Martin, eu não sei o que é que se passou na cabeça desse pessoal, mas o
que sei é que, se eles quiserem deixar os móveis, não tem problema nenhum... —
sorriu e disse — por mim, poderiam até deixar as contas pagas também.
O
que Rogério disse pareceu pôr fim ao assunto e, novamente, os três ficaram em
silêncio. Logo em seguida, Rogério foi averiguar a cozinha. Assim que ficaram a
sós, Martin perguntou:
—
E aí? O que está achando da tão famosa casa? Imaginava ela assim?
Kimberly
quase ia responder: “Sim, é exatamente do jeito que eu vi em meus sonhos, pois
eu já estive aqui antes. Foi por isso que eu não bati em nada quando a sala
estava às escuras.” — Mas limitou-se a dizer:
—
É... imaginei algo mais simples, mas é bem mais requintada... muito linda
mesmo.
—
Primo — chamou Rogério da cozinha — pode dar uma chegadinha aqui? Encontrei uma
ideia genial para a cozinha!
Martin
parou por um segundo indeciso se ia ou ficava e Kimberly lhe disse:
—
Vá lá... eu me viro por aqui, vou aproveitar para olhar o resto da casa... —
como Martin continuou parado, ela falou — vá de uma vez, eu não vou me perder
aqui — terminou sorrindo.
No
momento em que Martin entrou na cozinha, Kimberly imediatamente olhou para as
escadas e assustou-se. Elas eram exatamente como em seu sonho, exatamente
iguais!
—
Se for assim — disse baixinho para si mesma — então eu não vou me assustar se
eu subir as escadas e ver uma porta ao fundo do corredor... — falou enquanto
terminava de subir as escadas e caminhava pelo corredor do segundo andar.
A
imagem que acabara de ver era muito impressionante. Era tudo exatamente igual
ao que ela sonhara! Como poderia ser? Era um sonho, não? Será que ela estivera
realmente na casa através do sonho? Será que seu espírito estivera andando por
ali enquanto ela dormia? Kimberly não acreditava muito nesse tipo de coisa, era
mais realista, só acreditava nas coisas se visse com seus olhos, como São Tomé.
Mas aquilo... aquilo não podia ser ilusão, era muito real, tão real como a
agilidade com que passara pelos móveis da sala no escuro e encontrara o
interruptor de luz.
Permaneceu
por alguns segundos parada no início do corredor. E agora? O que deveria fazer?
Respirou fundo e começou a caminhar lentamente pelo corredor, já que estava
ali, a única coisa que tinha para fazer mesmo era continuar. De repente, teve
uma forte sensação de deja vú. Aquilo parecia muito com seu sonho, por
um momento, chegou a pensar que estava sonhando, mas concluiu que não quando
beliscou o braço e sentiu dor. Seguiu caminhando a passos lentos quando algo
lhe chamou atenção, algo que ela não tinha visto no sonho. Na parede do meio do
corredor havia um quadro e uma mesinha. Lentamente, ela parou de frente para o
quadro e deixou a pasta que carregava em cima da mesinha, pois queria ver
melhor de quem era a pintura. Quando viu a pintura, conseguiu conter um grito
de susto. A pintura retratava perfeitamente o homem com quem ela sonhara! Era
impressionante a semelhança! Era como se ela tivesse reproduzido em seus sonhos
a imagem do quadro e não o contrário. Observando melhor, ela viu que havia algo
escrito na parte inferior do quadro. Como o corredor estava escuro, Kimberly
teve de forçar um pouco a visão para conseguir ler o que estava escrito. Com
certa dificuldade conseguiu ler em voz baixa:
—
Ulrich von Goeth, primogênito da Família Real de Bonn — olhou mais uma vez para
o quadro e constatou que era realmente o homem com quem sonhara, com todos os
detalhes. Até a cor dos olhos verdes azulados eram exatamente iguais aos da
pintura. — E como é lindo! — Falou para si mesma enquanto suspirava.
Em
seguida balançou a cabeça como se quisesse espantar algum pensamento ruim.
Aquilo não estava certo. Como ela poderia ter sonhado com alguém, sem nunca
tê-lo visto antes? Isso era loucura e Kimberly estava com medo de estar
enlouquecendo.
—
Vou tirar essa história a limpo, — disse se afastando do quadro e começando a
caminhar pelo corredor com passos rápidos — vamos à prova final, então.
Acelerou
o passo e caminhou até a porta que havia no final do corredor, sem hesitar,
girou a maçaneta e abriu a porta. Em seguida, acendeu a luz e se espantou mais
uma vez. O quarto era exatamente igual ao do sonho.
Kimberly
caminhou até o centro do quarto enquanto balançava a cabeça de um lado para
outro como se não estivesse acreditando em nada do que acontecia, mas sabia que
não poderia permanecer na incredulidade por muito tempo. Eram coincidências
demais, provas demais que mostravam, diante dos olhos dela, que tudo o que ela
estava vendo, na verdade, já existia e era muito real.
Uma
brisa suave passou por ela e o perfume tão conhecido chegou ao seu nariz. Seu
coração bateu acelerado na expectativa de ver o estranho no instante seguinte,
mas não viu nada. De repente, a luz do quarto se apagou sozinha e Kimberly
entrou em alerta. Permaneceu parada, atenta a qualquer barulho ou movimento,
mas não conseguiu captar nada. Quando ia suspirar aliviada, ouviu uma voz baixa
e grave falar de algum ponto escuro do quarto:
—
Gute Abend, meine Prinzessin (boa noite minha princesa), eu disse que iríamos nos ver hoje, não
disse?
Kimberly
não esperou para ver o dono da voz, se assustou de tal forma que deu meia volta
e disparou correndo até chegar à sala, onde encontrou Rogério e Martin sentados
em confortáveis poltronas conversando sobre o que aconteceria se Rogério
comprasse a casa.
Quando
Kimberly surgiu diante deles com semblante assustado, Martin levantou-se
rapidamente e veio em sua direção.
—
O que foi que aconteceu, Kim? — Perguntou enquanto a abraçava. — Parece que viu
um fantasma...
Ela
levou algum tempo até se acalmar e poder falar.
—
Sou muito boba, me assustei com um vento de nada que balançou as cortinas e eu
pensei que fosse algum ladrão.
—
Puxa, eu nunca vi você assim — falou Martin preocupado — quer uma água?
Kimberly
balançou a cabeça negativamente e respondeu:
—
Não, obrigada. Vocês se importam se eu esperar no carro?
—
Sem problemas. Rogério pode me emprestar a chave? — Indagou para o primo que
observava a cena intrigado.
Rogério
tirou a chave do bolso e jogou para Martin que conduziu Kimberly até a porta de
saída. Caminharam até o carro em silêncio e depois que ela se acomodou no banco
de trás, ele disse:
—
Confesso que fiquei preocupado com você. Tem certeza que está tudo bem?
Kimberly
não respondeu. Simplesmente balançou a cabeça afirmando. De repente, ficara com
muito frio.
—
Vou ligar o carro e deixar o ar-condicionado no quente, você está tão gelada
quanto um sorvete.
Após
tomar as providências, Martin comentou antes de fechar a porta:
—
Se precisar de mim para alguma coisa, buzine. Nós não vamos nos demorar, só
vamos ver o segundo e o terceiro andares. Logo voltaremos.
Kimberly
fez menção de segurar o braço de Martin e dizer: “Não vá, há um homem estranho
lá em cima, provavelmente o dono da casa que morreu. Não vá, fique comigo!” Mas
a única coisa que conseguiu dizer baixinho foi:
—
Tudo bem. Obrigada.
Assim
que ficou sozinha no interior do carro, Kimberly fechou os olhos com força. Não
queria admitir, mas estava com medo. Não era normal o que estava acontecendo e
ela tinha receio de ficar paranoica igual ao seu tio. Desde que se conhecia por
gente, há vinte e cinco anos, ela nunca tivera nenhum tipo de experiência
estranha ou paranormal e agora, a partir do momento em que se “encantara” com
aquela casa, começara a ter sonhos estranhos e a prever as coisas. Com certeza,
estava com medo.
—
Kim, abra a porta para nós — pediu Martin batendo, de leve, na janela do lado
de fora do carro.
Kimberly
levou um susto tão grande que pôde jurar que pulou alguns centímetros do banco.
Rapidamente, abriu a porta para que os dois entrassem e se encolheu quieta no
canto direito do carro. Perdera-se em seus devaneios e não viu o tempo passar.
—
Está tudo bem, Kim? — Indagou Martin intrigado.
—
S-sim, cl-claro q-que está — respondeu gaguejando — só estou c-com frio, mas
logo vai passar.
Rogério
traçava planos sobre o que faria caso a venda da casa desse certo. Martin
concordava ou discordava conforme o assunto ia avançando e Kimberly não abriu a
boca em nenhum momento. Estava atordoada com o que acontecera e com medo de
estar enlouquecendo.
“Por
que será que ninguém falou do quadro do segundo andar?” — Questionava
intrigada. — “Será que eles não viram ou não quiseram comentar?”
Mas
estas seriam perguntas que não teriam respostas porque ela não perguntaria.
Até a semana que vem. Espero que tenham gostado.
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